PREFEITURA DE JUIZ DE FORA
DIÁRIO OFICIAL ELETRÔNICO DO MUNICÍPIO DE JUIZ DE FORA
ATOS DO GOVERNO DO PODER EXECUTIVO

Publicado em: 15/03/2023 às 07:05
RAZÕES DE VETO - A despeito do merecimento do Projeto de Lei nº 6/2022, cujo escopo é autorizar o Poder Executivo a conceder isenção total da tarifa de água, esgoto e drenagem às famílias vítimas de enchentes no Município de Juiz de Fora durante período determinado, de autoria do Vereador Bejani Júnior, vejo-me compelida a vetar o referido Projeto de Lei, já que não goza de substrato jurídico para subsistir na ordem constitucional vigente, ainda que seu propósito seja louvável. Na federação, o poder político é descentralizado e os entes federados são dotados, portanto, de autonomia política. E essa autonomia dos entes federativos pressupõe a existência de uma repartição de competências. O Estado federal tem como uma de suas principais características, portanto, a existência de uma repartição constitucional de competências: a Constituição Federal delimita as atribuições de cada um dos entes federativos. Nesse sentido, a repartição constitucional de competências pode ser considerada como um elemento fundamental da federação. Dessa maneira, a repartição de competências é baseada em dois princípios: i) princípio da predominância do interesse; e ii) princípio da subsidiariedade. Segundo o princípio da predominância do interesse, a União cuidará das matérias de predominância do interesse nacional; aos Estados, caberão as matérias de interesse regional; e aos Municípios, caberão as matérias de interesse local. O princípio da subsidiariedade, por sua vez, se baseia na lógica de que, sempre que for possível, as questões devem ser resolvidas pelo ente federativo que estiver mais próximo da tomada de decisões. A competência legislativa dos municípios, dentro dessa ideia de predominância do interesse, subdivide-se em exclusiva para legislar sobre assuntos de interesse local (art. 30, I, CF) e suplementar para suplementar a legislação federal ou estadual, no que couber (art. 30, II, CF) e, no que lhe diz respeito, a competência administrativa dos Municípios autoriza sua atuação sobre matérias de interesse local. Noutro giro, no art. 21, CF, estão as chamadas competências exclusivas da União. Trata-se de competências de natureza administrativa ou material, isto é, estão relacionadas à prestação (execução) de serviços públicos pela União. São competências indelegáveis: mesmo diante da omissão da União, não podem os demais entes federados atuar no âmbito dessas matérias. Ademais, não cabe ao Poder Legislativo, sob pena de grave desrespeito ao postulado da separação de poderes, consagrado no art. 2º da CF e, da reserva de administração, autorizar o Poder Executivo a executar atos que já lhe estão autorizados pela Constituição, conforme o entendimento jurisprudencial do STF pela invalidade das denominadas leis autorizativas traçado na Representação nº 686-GB em 1966 e hoje pacificado na jurisprudência. Sobre o tema: Autorizativa é a “lei” que - em não podendo determinar - limita-se a autorizar o Poder Executivo a executar atos que já lhe estão autorizados pela Constituição, pois estão dentro da competência constitucional desse Poder. O texto da “lei” começa por uma expressão que se tornou padrão: “Fica o Poder Executivo autorizado a...”. São possíveis, também, outras expressões autorizativas mais sutis. O objeto da autorização - por já ser de competência constitucional do Executivo - não poderia ser “determinado”, mas é apenas “autorizado” pelo Legislativo. Tais “leis” constituem um vício patente. Obviamente, são sempre de iniciativa parlamentar, pois jamais teria cabimento o Executivo se autorizar a si próprio, muito menos autorizar o que já lhe autoriza a própria Constituição. (BARROS, 2007, p. 249) [1] De acordo com a jurisprudência, o fato de a lei ser meramente autorizativa não modifica o juízo de sua invalidade por falta de legítima iniciativa, isto é, não lhe retira a característica de inconstitucionalidade. Com efeito, o Projeto de Lei nº 6/2022 se mostra como uma proposição autorizativa, como verifica-se do teor do seu art. 1º, sendo, portanto, inconstitucional. Dessa forma, dentro da sua competência constitucional, a União, a quem compete instituir diretrizes para o saneamento básico (art. 21, XX, CF), editou a Lei 11.445/2007 - Lei Federal do Saneamento Básico e o Decreto 7.217/2010 que a regulamentou, estabelecendo, dessa forma, as diretrizes nacionais para o saneamento básico. A Lei 11.445, com redação pela Lei nº 14.026/2020 - Novo Marco Regulatório do Saneamento Básico, no art. 23, IV, estabelece que a entidade reguladora, observadas as diretrizes determinadas pela ANA, editará normas relativas às dimensões técnica, econômica e social de prestação dos serviços públicos de saneamento básico, que abrangerá, entre outros aspectos, o regime, estrutura e níveis tarifários, bem como os procedimentos e prazos de sua fixação, reajuste e revisão. À vista disso, foi por meio do Convênio de Cooperação nº 02.2020.004, que o Município de Juiz de Fora, com a interveniência da Companhia de Saneamento Municipal de Juiz de Fora - CESAMA, transferiu à Agência Reguladora Intermunicipal de Saneamento Básico de Minas Gerais - ARISB-MG, o exercício das atividades de regulação e fiscalização dos serviços públicos de saneamento básico, inclusive as competências para fixação, reajuste e revisão dos valores das taxas, tarifas e outras formas de contraprestação dos serviços. Ante o exposto, entendo que o Projeto de Lei nº 6/2022 invade a competência exclusiva da União para instituir diretrizes para o saneamento básico, já estabelecidas na Lei 11.445/2007 - Lei Federal do Saneamento Básico e no Decreto 7.217/2010 que a regulamentou e, invade tarefa exclusiva da ARISB-MG que lhe foi legalmente transferida, independendo a Agência de lei autorizativa editada pelo Poder Legislativo Municipal através de iniciativa parlamentar para o exercício das suas atividades, o que caracteriza verdadeira ingerência do Poder Legislativo Municipal. Logo, o Projeto de Lei nº 6/2022 padece de inconstitucionalidade formal e material por ferir o disposto no art. 21, XX, da Constituição Federal e a legislação federal decorrente e, em última análise, os princípios constitucionais da reserva de administração, da separação de poderes e federativo, não se compatibilizando com o ordenamento jurídico pátrio, motivo pelo qual o veto integral a esta proposição legislativa é medida que se impõe. a) Prefeitura de Juiz de Fora, 14 de março de 2023. a) MARGARIDA SALOMÃO -  Prefeita de Juiz de Fora.
PROPOSIÇÃO VETADA - PROJETO DE LEI - Autoriza o Poder Executivo a conceder isenção total das tarifas de água, esgoto e drenagem às famílias e comerciantes vítimas de enchentes no Município de Juiz de Fora durante período determinado - Projeto nº 6/2022, de autoria do Vereador Bejani Júnior. A Câmara Municipal de Juiz de Fora aprova: Art. 1º  Fica o Poder Executivo autorizado a conceder junto à Companhia de Saneamento Municipal (Cesama) isenção total das tarifas de água, esgoto e drenagem às famílias e comerciantes vítimas de enchentes no Município de Juiz de Fora. Parágrafo único.  A isenção prevista no caput deste artigo se aplica durante os 3 (três) meses subsequentes aos períodos em que forem constatadas, pelo Poder Público, enchentes de grande proporção no Município. Art. 2º  As famílias e comerciantes vítimas de enchentes deverão procurar a Cesama para realização de cadastro e isenção durante o período estabelecido. Parágrafo único.  A fiscalização dos imóveis que serão isentos ficará a cargo da Cesama. Art. 3º  Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação.

[1]  BARROS, Sérgio Resende de. Leis autorizativas. Revista Mestrado em Direito Osasco, Ano 7, n.1, 2007, p. 243-253. Disponível em: < https://biblat.unam.mx/hevila/Revistamestradoemdireito/2007/vol7/no1/11.pdf>. Acesso em: 09 mar. 2023